8.1 MINI-HISTÓRIAS (Rapsódias da vida cotidiana nas escolas do Observatório da Cultura Infantil - OBECI

As mini-histórias e os processos de formação em contexto: o papel do coordenador pedagógico
Alexandra Flores Bitencourt
Carolina Lopes Kussler
Cristiane Hauschild dos Santos
Liliane Ceron
Luciane Varisco Focesi
Paulo Fochi
Vanessa Bremm Pauli

Entendemos que conectar a relação entre o cotidiano pedagógico e os processos formativos é um ponto central para a transformação dos contextos, pois envolve tanto os aspectos relacionados à formação como aqueles relativos à pedagogia desenvolvida em cada instituição.
[...]
Esses três aspectos - a formação que mobiliza a escuta das crianças pelos professores, assentar-se em teorias de base, contrastar o cotidiano - ajudam-nos a compreender de que modo o trabalho com as mini-histórias também auxilia nos processos de formação dentro das escolas  do OBECI.

Escutar as crianças
Nas escolas que compõem o OBECI, valemo-nos da estratégia da Documentação Pedagógica para ver, perceber, refletir, transformar e narrar as aprendizagens das crianças e para construir o conhecimento praxiológico.

[...] A relação educativa precisa estar centrada na capacidade do professor escutar e responder às necessidades das crianças. [...] a escuta, enquanto uma metáfora relacional entre adultos e crianças, é um aspecto importante da ação pedagógica, pois como sublinha Hoyuelos (2007, p. 01, tradução nossa),

Escutar  é, na realidade, uma arte para entender a cultura infantil: sua forma de pensar, fazer, perguntar, teorizar. Escutar significa estar atento, com todos os sentidos para reconhecer todas as linguagens da infância e sua relação com o mundo. A escuta possibilita o assombro , a maravilha do inesperado e do imprevisto.

[...] as mini-histórias podem assumir um papel de revelar as aprendizagens , as vivências, as brincadeiras, as investigações, a s conversas e mostrar o quão potentes são as relações dentro da escola.

As teorias de base
[...] Apoiados nas concepções das pedagogias participativas, professor e coordenador constroem um processo formativo sustentado pelo diálogo e pela reflexão. Nesse processo, temos buscado diferentes maneiras para olhar o cotidiano pedagógico e transformá-lo. A esse respeito, Fochi (2019, p. 199) comenta que:
Nos primeiros anos do OBECI, fomos investigando e transformando o cotidiano pedagógico, tanto no nível da gestão quanto no nível da sala de referência e, com isso, percebemos a recorrência de alguns temas, por exemplo: a urgência de refletir sobre a organização do tempo, pois na medida em que avançávamos com as reflexões, mais notório ficava que o modo como a gestão do tempo acontecia nas escolas era problemática; o tipo de materiais que se oferecia para as crianças e as razões dessa oferta; o modo como organizar o espaço para superar uma simples ideia de decoração ou espaço recreativo e passar a compreender o espaço como relação; o trabalho com os pequenos grupos como alternativa para escutar as crianças e, talvez, o principal tema, o reposicionamento do adulto e seu papel frente às crianças. Além desses que poderíamos dizer que compõem uma certa didática, o outro aspecto era como narrar as aprendizagens das crianças.

[...] as mini-história acabaram tornando-se um instrumento valioso e dinâmico para narrar e argumentar sobre as aprendizagens das crianças e sobre o valor da vida cotidiana em uma instituição educativa.
[...] As mini-histórias apresentam a importância do cotidiano para as crianças e para os adultos, através de narrativas repletas de sentidos e significados, rompendo com um currículo prescritivo, para compreensão da importância de um currículo narrativo.

Contrastar o cotidiano
Acreditamos que qualificar a vida cotidiana significa pôr em atenção no modo com as crianças estão vivendo  suas infâncias. Garantir que os meninos e as meninas tenham tempo para as diversas oportunidades educativas que acontecem em uma instituição, sem apressá-los, sem artificializar os modos que eles podem apreender o mundo, é um aspecto central na invenção da docência (FOCHI, 2019, p. 179).

Assim, garantir que as infâncias sejam vividas com tempo, exige adultos que observem e reflitam sobre o contexto educativo para ser possível problematizar o cotidiano pedagógico, de forma mais atenta para organizá-lo de modo a respeitar as diferentes necessidades das crianças.

O papel do coordenador
Como nos apoiamos na estratégia da Documentação Pedagógica para fazer a formação em contexto, adotamos como prática a produção de observáveis para nos ajudar a ver o cotidiano pedagógico e a criar um ponto em comum de diálogo e confronto entre professor e coordenador. Por observáveis entendemos como:
registros feitos a partir de observações do cotidiano e que garantem a possibilidade de serem utilizados para refletir. Os observáveis são, necessariamente, materiais concretos: fotografias impressas, arquivos de fotografia, arquivos de vídeo, anotações do professor, exemplares de produções das crianças (FOCHI, 2018, p. 157)

Em outras palavras, os observáveis são algo que se pode analisar posteriormente ao momento em que ocorreu, que pode ser sujeitado a diferentes olhares para ganhar as novas camadas de compreensão. É a partir do exercício de rever os observáveis  que se elege algo episódico para narrar, como uma mini-história.

Aprender em companhia
Com esse processo  reflexivo compartilhado, vai se construindo a identidade profissional a partir d exercício de revisitar as concepções que pré-existem dentro de nós, assim como os conhecimentos dos professores, suas subjetividades, suas teorias de referência, suas hipóteses e perguntas frente a cada escolha. É nesse exercício contínuo de reflexão que vamos construindo uma ideia de professor de Educação Infantil.

[...] entendemos que as narrativas devem ser sempre compreendidas como interpretações da realidade e, com isso, assumir um caráter provisório, episódico e parcial. 
    Um outro aspecto emergente da prática com as mini-histórias é o desafio de produzir textos pedagógicos a partir do cotidiano.

Narrar as aprendizagens das crianças
[...]
Uma das principais características da escrita das mini-histórias é valer-se da observação das ações e interações das crianças ao longo da jornada diária.

[...] Busca-se que os professores investiguem o modo como as crianças aprendem  e como podem criar as condições externas adequadas (tempo, espaço, materiais, organização de grupos), possibilitando as pesquisas e descobertas das crianças. Dessa maneira, as mini-histórias são, ao mesmo tempo, um modo de narrar as experiências compartilhadas entre crianças e adultos e, também, de reflexão e problematização sobre o próprio contexto educativo.

[...] é preciso exercitar um olhar sensível e atendo ao mundo  das crianças. Para isso, exige aprender a narrar  sobre as atuações  dos meninos e das meninas acolhendo a complexidade que ali reside.

Escola Municipal João de Barro
[...] Ao partilhar as mini-histórias com a coordenação, é possível repensar sobre palavras, seleção e edição de imagens, principalmente como valorizar o protagonismo das crianças, sem fazer uso de um texto descritivo, tampouco om julgamentos ou a moral da história.
[...]
Ter como premissa partilhar, através das mini-histórias, a jornada de cada criança é um desafio constante para toda a equipe. Da mesma maneira, envolver cada professor que passa a integrar a escola, valorar os momentos de estar com as crianças, desenvolver a capacidade de escuta, observação e registro é uma busca constante para garantir um cotidiano que possibilite um trabalho compartilhado entre todos os envolvidos.

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